Os Conservadores São Egoístas?

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Este tópico contém resposta, possui 1 voz e foi atualizado pela última vez por Profile photo of MauricioSaraiva MauricioSaraiva 4 mes, 3 semanas atrás.

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    Os Conservadores São Egoístas?

    São bem conhecidas as posições conservadoras do jornalista Reinaldo Azevedo. Ora, na Wikipedia, podemos encontrar esta citação sua: “Com raríssimas exceções, quase santas, o homem normal se ocupa é de si mesmo e de sua família. É o correto. A civilização se forma assim. O egoísmo é o mais altruísta dos sentimentos”.

    Naturalmente o egoísmo de que nos fala Azevedo é este amor próprio comum a todos os homens e que foi popularizado por Mandeville com sua Fábula das Abelhas. Pedra angular do liberalismo ocidental é o argumento de que uma sociedade de egoístas, se fundada na liberdade, produzirá uma sociedade próspera e, em linhas gerais, boa: vícios privados, benefícios públicos.

    Uma versão um tanto mais estridente desta mesma posição foi apresentada pela nova enfant terrible da direita latino-americana, a guatemalteca Glória Álvares, falando no Fórum da Liberdade, em Porto Alegre: “Há uma verdade que todo ser humano deve alcançar para ter paz, se não quiser viver como um hipócrita. Todos nós, 7 bilhões e meio de seres humanos que habitamos este planeta, somos egoístas. É essa a verdade, meus queridos amigos do Brasil, todos somos egoístas. E isso é ruim? É bom? Não, é apenas a realidade”. Sem explicar que tipo de amizade existe entre os egoístas, ela prossegue: “Há pessoas que não aceitam essa verdade e saem com a maravilhosa ideia: ‘Não, eu vou fazer a primeira sociedade não egoísta’. Cuidem-se, brasileiros; cuide-se América Latina!” Então essa egoísta preocupada com os latino-americanos segue em seus solidários conselhos: “Esses espertinhos são como Stálin, na União Soviética, como Kim Jong-un, na Coreia do Norte, Fidel Castro, em Cuba, Hugo Cháves, na Venezuela”. Álvares conclui contestando a propalada necessidade de “homens que não pensam só em si”. Ela, que pensa só em si, ainda se dá ao trabalho de nos advertir: “…a menos que seja um marciano, esse homem não existe, nunca existiu, nem existirá jamais”. É aplaudida de pé.

    Podemos admitir que a grande maioria dos atuais conservadores brasileiros está de acordo com Azevedo – e, tirando a pirotecnia de auditório, com nossa adorável Glória Álvares. O que nos motiva aqui, entretanto, é nossa convicção de que tal máxima está fundamentalmente errada. Mais que isto, ela está na raiz da crise do conservadorismo – ou da hegemonia das doutrinas progressistas, sua antítese – ainda que os conservadores não atentem para isto. Escrevemos para dizer que não, não somos egoístas, e se pensamos que somos – e se nos jactamos disso até – é porque fomos a isso levados por um caminho infeliz do moderno pensamento ocidental.

    Este não é o sítio para fundamentarmos tão inusitada sugestão. Diremos apenas que, se o egoísmo fosse de fato uma legítima convicção conservadora, não existiria demanda para sua infindável defesa, uma reiteração que já ultrapassou os três séculos e que, todos sentimos, precisará ser repetida às novas gerações conservadoras e liberais. Simplesmente, é algo que acreditamos, mas não é algo que sentimos. A defesa do egoísmo faz parte da defesa de uma doutrina – a doutrina liberal, e para nós é tão confortável acreditar que vícios privados produzam benefícios públicos, que não nos damos ao trabalho de verificar seriamente a tese.

    Até agora, a principal oposição ao egoísmo liberal veio dos socialistas: “como os vícios privados produzem um resultado geral ruim, precisamos de algum tipo de autoritarismo que inibe tais vícios”. É contra essa pretensão que nos insurgimos e afirmamos, a três séculos, a utilidade do egoísmo. Todavia, o argumento socialista em pauta é perfeitamente válido! O problema é sua premissa: a de que somos indivíduos egoístas. Ela é falsa. Em termos precisos, o argumento socialista é formalmente válido, mas não é verdadeiro.

    Já nos atentamos para o fato de que esperamos dos políticos, precisamente, um comportamento não egoísta? Alguém dirá, forçando muito a realidade, que um egoísta pode querer ser um político honesto pelos benefícios que isso traria numa sociedade extremamente organizada. Na prática, uma república de políticos egoístas, funcionários egoístas e até de eleitores egoístas sempre oferecerá vantagens muito significativas para a desonestidade. Se, no mundo real, a desonestidade ainda não impera completamente, não é porque um arranjo feliz de vícios privados esteja funcionando como regulador eficiente, mas porque pessoas virtuosas bem posicionadas na Justiça, no Parlamento, na Imprensa e nas demais instituições exercem sua influência salutar. Não nos refirimos a santos, apenas a pessoas tão honestas quanto eu e o leitor. Sejamos francos: esse blog não foi feito por motivações egoístas. O ganho privado que ele pode, um dia, vir a gerar para seus administradores, além de incerto, está muito longe dos esforços que ele demanda. Não seria mais lucrativo ir pegar uma praia? Isso vale certamente para as atividades sociais do leitor. O amor próprio tem seu papel, mas um indefinido sentido de bem público geralmente nos anima ainda mais. O próprio Reinaldo Azevedo afirma desconfiar de quem se preocupa com os outros, mas ele não escreveu No País dos Petralhas para si mesmo. Existe o ganho dos direitos autorais, mas seu livro não se reduz, evidentemente, a um simples projeto comercial.

    No mesmo parágrafo que extraímos a citação acima, Azevedo critica as ONGs: “Atuar em ONG ou é oportunismo ou é questão psicanalítica”. Ora, oportunismo não é uma forma de egoísmo? O cara cínico da ONG não é um egoísta? O PT, em última análise, é uma eficiente organização de egoístas. Os blogueiros mercenários, bancados pelo Governo Dilma, egoístas! Os empresários corruptos que bancam as campanhas do governo socialista, egoístas! E onde estão os tais benefícios públicos de tantos vícios privados?

    Então por que, afinal, passamos a argumentar que somos todos egoístas? Vamos corrigir a pergunta: Por que o Iluminismo nascente precisou aderir a esse modelo do homem egoísta como sua premissa fundamental? E, principalmente, ela é mesmo verdadeira? Não enfrentar esta questão tem custado aos conservadores um silêncio constrangido diante do vicioso egoísmo progressista – trezentos anos de silêncio.
    Maurício Saraiva.

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